11 de dezembro de 2004

Amor é pra quem tem, não pra quem quer.

Anteontem, dia 8 de dezembro, estava eu em uma palestra sobre o Império Norte-Americano e a Ordem Mundial: Cenário pós-Bush 2, na qual o palestrante Demétrio Magnoli, professor de Geografia Humana da USP, editor do jornal “O Mundo” e articulista da Folha de São Paulo falava sobre a dominação norte-americana, a guerra contra o terror, e também sobre a questão do petróleo. Em um dado momento, após breve explicação sobre a origem da Arábia Saudita e sua faraônica produção petrolífera de sete milhões de barris diários, ele disse que o petróleo era o segundo bem mais mal distribuído do mundo, comentário esse que deixou a platéia com certo ar de indagação sobre qual seria o primeiro. Após alguns demorados segundos de silêncio, ele disse: “O primeiro é o amor.”.

Apesar de não passar de uma brincadeira da parte do palestrante, tal afirmação possui uma enorme carga de veracidade, perceptível principalmente pelos que ainda anseiam pelo amor verdadeiro. Por causar tanta polêmica, ser passível de diversos tipos de julgamento e possuir incalculáveis significados, não entrarei na questão do amor verdadeiro. Nem mesmo eu sei o que viria a ser esse mitológico e forte sentimento que habita a nossa consciência coletiva.


Desde nossos antecessores, sempre houveram machos com inúmeras fêmeas à disposição, seja pela força física, pelo tamanho, ou pelos bens que possuía, mas isso não interessa: esses machos nasceram de modo a obter mais fêmeas que os outros machos. A poligamia é um dos tipos mais desiguais de organização social dos indivíduos enquanto família: enquanto poucos têm muito, muitos têm pouco, se é que me fiz entender. Por isso Deus criou um indivíduo de cada sexo, e não dois ou mais pra cada sexo. Não creio ser, a prática poligâmica, natural do ser humano, e sim, fruto de sociedades que viveram dessa maneira, sendo elas principalmente machistas e autoritárias, colocando mulheres à disposição dos nobres para todos os tipos de serviço, inclusive os sexuais.

A má distribuição do amor é não somente sentida pelos que não o possuem. Muitos discordarão sobre essa afirmativa, que defendo, mas muitas pessoas que possuem o amor em abundância percebem que o possuem, e que outros não. Aqueles que já possuem o amor em suas vidas sabem o quão desigual é essa divisão, mesmo estando sempre acompanhados, e essas pessoas têm noção do que possuem. E sabem disso, pela razão oposta aos que não possuem: uns tem, outros não. É simples. O amor é distribuído como em um jogo de cartas, em que as cartas com altos valores são escassas, e as cartas de baixo valor, e até insignificante, são abundantes. Pode ser que eles julguem ser normal a aquisição de cartas altas, mas a meu ver, só é normal e justa essa divisão para quem as recebe.

Não creio que a escolha de uma parceira ou um parceiro seja uma questão de sorte, desejo divino ou um caminho predestinado. Acredito que a conquista é, quase em sua totalidade, definida pelo talento. Muitas pessoas, assim como eu, acreditam que o ser humano nasce com um talento escondido, um dom. Existem pessoas geniais em cálculos, outras em trabalhos manuais, outras detém o poder da retórica, e outros a habilidade da conquista. É tão nítida a diferença entre quem possui esse último talento e quem não possui, que creio não existirem argumentos suficientemente fortes para derrubar essa teoria. Seria Deus o criador de tal dom? Caso haja sido, defendo que essas pessoas desprovidas da habilidade da conquista deveriam nascer também, sem os hormônios que estimulam a sexualidade, pois é natural dos seres humanos terem vontade de se relacionar com uma pessoa bonita, bem apresentável, simpática, e nem todos conseguem. É o mínimo que Deus poderia ter feito para nós, reles mortais, que não conseguem alcançar a felicidade por meio de um amor. Mesmo assim, continuam querendo amar e serem amados, num jogo de tentativas e erros, com a infeliz maioria de insucessos.

Não é raro ouvirmos comentários acerca da beleza de um dos membros de um casal ser contrastada com a falta da beleza em outro membro. Já presenciamos inúmeras vezes pessoas que julgamos feias viverem um relacionamento afetivo bem estruturado e estável com pessoas ditas lindas. Seria esse um consolo para as pessoas consideradas feias? Ou seria esse mais um sinal da vida, alertando que só as pessoas ricas, educadas e saudáveis podem conseguir se relacionar com pessoas bonitas? A meu ver, o dito popular “para todo pé cansado existe um par de chinelos velhos”, é um dos piores eufemismos já criados pelo homem. Não creio que exista ninguém em sã consciência desejando viver feliz para sempre com uma pessoa feia ao seu lado. Por mais que isso soe preconceituoso, é irracional não dizermos que a primeira característica a ser notada em uma pessoa, é a física. A visão, normalmente, é a primeira a receber um estímulo do sexo oposto - ou mesmo sexo, para alguns. A beleza é, sim, um talento dado para a conquista, assim como a força, a lábia, ou o carisma.

É bem verdade também, que muitas pessoas detentoras de amor em excesso não conseguem manter uma estabilidade no relacionamento. Não sei o porquê disso, creio que ninguém saiba, mas talvez seja exatamente pela gama de opções disponíveis para elas. Será que muito amor pode atrapalhar? Será que a abundância desse sentimento, vindo de diversas pessoas para apenas uma, impede que essa tenha um relacionamento duradouro e estável? Como sabemos também que pessoas com dificuldades para encontrar esse amor também são suscetíveis a desestabilidade e desestruturação do relacionamento, não me demoro mais nesse questionamento, que foge um pouco à pauta inicial, mas é de grande relevância, podendo ser ainda, quem sabe, abordado a posteriori.

Aí é que fica a minha dúvida. É justo passarmos a vida toda procurando por um amor verdadeiro, enquanto pessoas conseguem um leque de opções num estalar de dedos? Tudo bem se uma pessoa é o rei da matemática, ou o mestre da música, mas em seu sangue continua correndo hormônios que lhe lembram a todo instante da necessidade de se ter alguém para amar e de que esse amor seja retribuído. Creio ser melhor não sentir o amor se não puder o possuir, a senti-lo e viver sem sua presença.

Demétrio foi muito feliz ao dizer aquelas sábias palavras: o amor é o bem com a pior distribuição no mundo. O sentimento de indagação causado por tal afirmativa também - creio eu - assolou o próprio Demétrio, que sabe da má distribuição do amor, mas não conhece uma maneira para saná-la, assim como todos os ali presentes. O amor é de um tanto abstrato e ao mesmo tempo real, pois podemos sentir sua presença e sua falta, mas não conseguimos de maneira alguma, defini-lo. Então se você não tem um amor, não se sinta só: muita gente também não tem petróleo.


- De qualquer maneira, imortalizado. -

2 comentários:

  1. "Então se você não tem um amor, não se sinta só: muita gente também não tem petróleo." Nice! =D

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